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Natielly Santos

Cultura coreana impulsiona trabalhos na internet

Monetização ainda é empecilho para firmar a prática como profissão

O boom causado por Gangnam Style, do cantor coreano Psy, em 2012, e o consequente interesse de grupos juvenis pela indústria cultural sul-coreana abriu espaço para o surgimento de canais de vídeo, blogs e vlogs sobre os diversos assuntos que envolvem a cultura coreana, assim como aumentou a venda de produtos coreanos e o número de acessos a sites brasileiros que abordam a Coreia. Só no Brasil são cerca de cinco vídeos publicados por semana, na plataforma YouTube, sobre o grupo BTS, maquiagem coreana, pronúncia de nomes coreanos, noitadas na Coreia do Sul, entre outros temas, e diversos e-commerce fundados nos últimos anos.

Uma das responsáveis pela difusão da cultura é a Hena Cho, 29 anos, do canal Hey Unnie. Ela é coreana e veio com a família para o Brasil ainda adolescente, em decorrência da crise financeira de 2008, que atingiu as principais economias mundiais, após a quebra do banco norte-americano Lehman Brothers. Para Hena, o pico de crescimento da cultura coreana no país foi há quatro anos, mas o interesse por esse país asiático se mantém até hoje. “É perceptível que a quantidade de eventos de cultura pop coreana e de shows de K-pop cresceu no Brasil. Neste ano, mais de 10 grupos vieram para fazer apresentações”, diz.

Hena acredita que o interesse dos brasileiros passou do nível K-pop. “A cultura está se expandindo. Agora, as pessoas assistem a filmes e novelas coreanas, conhecidas como doramas, e se importam em aprender o idioma”, explica.

A youtuber com mais de 100 mil inscritos tem uma história curiosa. Embora resida atualmente em Curitiba (PR) antes morou por três anos no Paraguai, onde havia muita violência, segundo ela. Depois, conheceu o Mato Grosso do Sul e passou quatro anos em Florianópolis (SC).

Também há três anos, a estudante de Arquitetura e Urbanismo Thais Midori, 23 anos, criou o canal Midori, que hoje tem cerca de 673 mil inscritos. No caso dela, descendente de japoneses, o interesse pela cultura é antigo. “Surgiu em 2005, mas só em 2016 pude ir para a Coreia do Sul. Fiquei um ano lá, fazendo intercâmbio, e desde então sempre vou nas férias do meio e final do ano”, comenta.

Em julho de 2017, Thais foi convidada pelo governo coreano para falar sobre turismo e comida no canal. “O governo realizou um evento, no qual selecionou pessoas de vários países. Foi bem legal”, conta. Nos seus vídeos, Thais mostra como é o dia a dia na Coreia, visita lojas coreanas, imita ensaios fotográficos de grupos de K-pop, entrevista artistas coreanos, entre outros.

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Foto: Arquivo pessoal

Apesar disso, ambas são unânimes ao afirmar que o trabalho na internet é instável. “Enquanto a cultura coreana estiver no auge, dá para ganhar dinheiro, sobreviver com isso. Mas, não vejo como uma profissão para a vida toda”, afirma Hena.

Movido pela vontade de trabalhar home office e com o que ama, o profissional de Marketing Igor Brandão, 25 anos, fundou, em 2013, o e-commerce Yoh Store, especializado em moda oriental. Cerca de 35% do faturamento da loja é proveniente da venda de produtos da categoria K-Pop. Em maio de 2018, esse número chegou a 63%, devido à realização de uma campanha voltada para os fãs do BTS.

Diferente de Hena, Igor acredita que esse gênero ainda é o interesse principal dos brasileiros, pelo menos entre os adolescentes de 15 a 21 anos, faixa etária dos clientes da Yoh Store. “Existem vários gêneros musicais na Coreia, assim como no Brasil, onde temos o sertanejo, a MPB, mas o K-pop é o mais difundido fora da Coreia e chegou muito forte ao Brasil, principalmente depois que o BTS ganhou o prêmio da Billboard”, declara. Ele divide a loja com dois sócios e fatura em torno de R$ 20 mil por mês.

Por não terem com quem conversar sobre as séries, filmes e outros aspectos da cultura coreana, os profissionais de Marketing Digital Letícia Fontes, 28 anos, e Filipe Otavio, 28 anos, resolveram criar, no início deste ano, o Papo Coreia, um canal de interação com os apaixonados pela Coreia do Sul. Alguns meses depois, em julho, nasceu a loja virtual, que é “linkada” ao portal. A razão para a criação da loja de camisetas, bolsas, canecas, quadros, entre outros itens, foi o crescimento explosivo do grupo BTS e a falta de camisetas com estampas criativas, tanto que o produto que gerou mais interesse do público foi a blusa “I’m Fine”, uma das faixas do álbum Love Yourself: Answer, lançada em agosto.

O Papo Coreia tem uma média de 100 visitas diárias e 3 mil mensais, mas esses números não refletem na rentabilidade e, por esse motivo, ambos se dedicam também à agência de consultoria em marketing digital que administram juntos.

A pouca monetização ou a falta dela é causada por alguns fatores. Entre eles, a utilização de palavras-chave e a maneira de exibição dos anúncios escolhidos.“O Google exibe os anúncios de três formas. A segmentação contextual é a mais utilizada, porque os anúncios aparecerem de acordo com o conteúdo que é produzido. Então, ficam mais naturais, mais orgânicos, o que ajuda na Taxa de Clique”, explica Letícia. Ainda assim, a geração de receita depende da quantidade de cliques e visualizações de página.

Situação semelhante acontece com a Thais Oliveira, 29 anos. Nascida em Brasília, Thais foi à Coreia do Sul para fazer o mestrado de Design de Moda. Um pouco antes, em 2013, criou o canal e o blog Na Terra de Kimchi, no qual fala sobre os costumes coreanos, diferenças entre Brasil e Coreia, K-pop e muitos outros assuntos. Como mora em Seul, capital que tem muito kimchi - acompanhamento principal de qualquer comida coreana - decidiu nomeá-los desta maneira. Ela relata que um dos seus vídeos tem cerca de 16 mil visualizações, mas nunca foi remunerada pela plataforma. “Estou prestes a receber algo, mas não é muito”, revela.

Isso acontece, porque são necessárias, no mínimo, 10 mil visualizações, que dependem muito do formato de anúncio escolhido pelo dono do canal.  Apesar disso, Thais não se abate e pretende continuar com o canal. “Faço por amor”, declara.

Coreias x Japão

A relação conturbada entre as Coreias e o Japão vem de muito antes. Ela começou em 1592, com a Guerra Imjin, e se intensificou com a transformação da Coreia em colônia japonesa, de 1910 a 1945, período marcado por forte repressão aos opositores. Nesses 35 anos, o povo coreano foi obrigado a desfazer-se da cultura e idioma do país nativo em prol da língua e cultura japonesas. Além disso, as Coreias sofreram com a divisão de trabalho entre o Norte e o Sul, que impactou fortemente no desenvolvimento. Enquanto o Norte concentrava as atividades de mineração e a indústria, o Sul produzia os bens de consumo, sobretudo os têxteis, e os alimentos. Essa divisão é perceptível até hoje, uma vez que ambas as Coreias possuem sistemas políticos e econômicos extremamente diferentes. Tais acontecimentos contribuem para a rivalidade entre as Coreias e país da Ásia Oriental. 

Japão

“O canal surgiu, em 2015, da vontade de divulgar o trabalho como professora de coreano e oferecer material de acompanhamento. Outro motivo é que eu queria falar da cultura do ponto de vista de uma nativa, no sentido de mostrar a veracidade das coisas”, explica Hena, que aos sábados dá aula para 12 alunos, na própria casa. A imigrante também trabalha como freelancer em filiais de empresas coreanas, ao realizar legendamento e tradução de contratos e manuais.

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